quarta-feira, 30 de novembro de 2011

A Saga Crepúsculo - uma nova vida!


Por fim, o que me motivou a falar sobre a saga hoje foi uma leitura que considerei equivocada do penúltimo e mais recente filme, "Amanhecer - Parte 1".

Acho importante relembrar que não existe filme ruim ou bom. O que existe é a opinião de cada pessoa sobre um livro ou filme, associadoa aos aspectos levantados para formular essa opinião. Mesmo que esta opinião seja de senso comum, ainda cabe ser respeitada, já que gosto não se discute, mesmo sendo construído socialmente. (Engana-se aquele que acha que controla seu gosto! Somos mediados o tempo todo e nosso gosto também!)

O que me preocupa é a falta de reflexão sobre a relação que se estabelece com o filme. Porque gostei ou não gostei? O que acho bom ou ruim? E é preciso se esforçar em enxergar além da superfície, tentar usar toda a sensibilidade possível para conectar-se com o mundo e com tudo que faz parte dele. Seja livro, filme, pessoa ou qualquer outra coisa.  

Acho que antes de criticar qualquer coisa, principalmente um blockbuster, que é o caso da Saga Crepúsculo, é preciso  entender que existem filmes que são simplesmente realizados para agradar e entreter a plateia, e criticar esse tipo de filme, tendo em mente outro tipo de cinema é uma perda de tempo e não restará nada para falar. Será julgado como 'lixo' e ponto final! Um grande equívoco. Até no 'lixo' é possível produzir arte, não?! (Vik Muniz)

É também importante considerar que a saga foi escrita para adolescentes e no Brasil arriscou-se ampliar o público, direcionando-se a obra para mulheres de todas as idades. Outro lembrete importante é o fato da autora ser mormon e conseguir concilicar valores da sua religião (sexo após casamento, por exemplo) com uma história moderna para garotas, mesclando vampiros e uma intensa tensão sexual.

Segurar um espectador por quase 2 horas para rolar somente 2 beijos não é pra qualquer um!! (como acontece no primeiro filme da saga). É preciso criar expectativa, tensão sexual e uma conexão muito intensa (que já acontece no livro e é muito bem trabalhado no filme, para quem gosta dele!) para segurar alguém dessa forma, justamente numa sociedade onde a mulher se desvaloriza cada vez mais.

A história de amor entre Bella e Edward (Romeu e Julieta moderninho) resgata o flerte, o toque, o beijo, ou seja, o mínimo de uma relação para criar toda essa tensão e isso é genial!

Como é uma obra para agradar e entreter, é natural que em sua adapação fílmica utilize de todas as artimanhas para atrair espectadores, como expor corpos sarados (Jacob e Edward), abusar de cenas românticas e de ação. No contexto publicitário, interessado em persuadir e conquistar o cliente/espectador, o apelo ao sexo e ao humor são comuns. Essa é a fórmula do cinema industrial, aqui empobrecida por uma história que já é superficial nos livros, por conta de seu público-alvo.

Por essa razão, acho que analisar um filme como este e detonar seus defeitos é o mais fácil de fazer. Difícil seria apontar algo de bom! O esforço seria justamente de encontrar alguma qualidade em algo que se propõe ser tão atrativo e feito para corresponder expectativas.

Amanhecer - Parte 1 - uma nova vida!

Seguindo a trajetória da história de amor entre Bella e Edward, a primeira parte do livro e filme mostra o casamento entre os dois, celebração da união eterna, que será selada com a transformação de Bella em vampira, tornando o casal imortal.

Tudo corre dentro do planejado até que Bella se descobre grávida, algo supostamente inédito entre vampiros. Como um ser imortal poderia engravidar uma mortal?! Se usarmos a racionalidade não seria possível, mas desde quando ser racional respondeu a todos os mistérios da vida humana?! Quantos milagres não foram comprovados cientificamente, mas ainda assim foram milagres?! Contradizendo todas as possibilidades racionais, Bella engravida e tem uma gestação incomum, acelerada e imprevisível, onde toda sua energia é sugada por um bebê que ninguém sabe dizer o que é. Mortal? Imortal? Humano? Monstruoso?

Diante de suposições, Edward prefere não arriscar a vida de Bella e sugere o aborto. Jacob fica chocado e seu grupo de lobos resolve evitar o nascimento da criança-monstro. A família Cullen divide opiniões e Bella conta com a ajuda de Rosalie que sempre foi hostil com Bella, justamente por ser contrária a sua transformação, opção que não teve quando humana. Por haver essa possibilidade da vida, Rosalie é quem defende, protege e apóia Bella até o último momento.

Contrariando a todos e pondo em risco a própria vida, Bella está determinada em priorizar a vida da criança, tendo esperança que no último momento, seja transformada em vampira para evitar a própria morte. Com a sensação de impotência, Edward aceita a condição, sem nada poder fazer e correndo o risco de perdê-la.

Em determinado momento da gestação consegue usar seu dom de ouvir pensamentos e se comunica com o bebê. É a primeira vez que Edward aceita a nova vida em Bella e se desculpa por não ter dado o apoio que ela precisava. A união entre os dois se fortalece na formação de uma nova família, instituição valorizada pela religião cristã (e mormon).

Durante o parto a profecia se cumpre e Bella está fraca demais para enfrentar uma transformação, mas Edward desesperado em salvá-la, injeta seu veneno e a morde, com a esperança de que funcione. E funciona! Bella está imóvel, mas vemos a agonia de sua alma durante sua transformação física. O último plano é um detalhe de seus olhos e nos perguntamos, quando ela abrir, de que cor serão?! Pretos de fome? Amarelos de bondade ou vermelhos de sede?!

Neste sentido, diferente dos outros filmes, esta versão é mais mórbida e sarcástica, já que narra fatos tão incomuns. O romantismo dá lugar ao horror da transformação de Bella, agonizando em sua alma; da gestação acelerada que gera um intenso desgaste físico, revelando uma Bella cadavérica; da necessidade de Bella beber sangue para alimentar seu bebê; das conseqüências cruéis de se entregar a uma relação tão improvável como a de uma humana com um vampiro, simbolizadas com horror no pesadelo de Bella antes da cerimônia, onde todos estão mortos!

Se fosse na vida real, a história de amor improvável seria mais mórbida que romântica, é o que parece ser a mensagem do filme, mediada pelo diretor e sem necessariamente ser a do livro. Porém, o próprio livro parece ser uma ruptura com o romantismo ao apresentar todo esse show de horrores, mesclando valores da vida humana com a realidade cruel dos seres imortais. Não é um casamento qualquer, não é uma criança qualquer, nem uma família qualquer! São vampiros, bebedores de sangue, mortos-vivos, sedutores e sem alma. Vale a pena tudo isso?! É isso que Bella realmente quer?! E quais as conseqüências?!

5 comentários:

Lauro Jorge Amorim disse...

Eu vejo da seguinte forma:Crepusculo é da mesma linha de filme que Transformers.É um filme blockbuster bobinho,cada um feito pra um genero de pessoa definido.Eu não gosto mesmo de nenhum dos filmes mas,muitas amigas minhas odeiam transformers.

ally_c disse...

Olá Lauro! Cada um poder ver o que quiser aonde quiser, inclusive no cinema. Uma coisa é ser cinéfilo, outra é ser formado em cinema. São coisas diferentes e fundamentações bem diferentes. Muitas vezes os amantes do cinema defendem sua opinião baseados apenas na própria opinião e no senso comum. Num curso de graduação em cinema você aprender a ver além da superfície e é preciso muito treino para desaprender determinados preconceitos. Nem todo mundo consegue e há uma grande maioria que defende um suposto 'cinema-arte', numa era de total incerteza sobre o que é arte. (continua)

ally_c disse...

Se você quer sair da 'superfície' leia algumas coisas, como "A câmera clara" de Roland Barthes, onde ele fala sobre o punctum; leia "O clube do filme de David Gilmour" onde ele fala dos prazeres culpados; leia "Arte-mídia" de Arlindo Machado onde ele desconstrói essa ideia do cinema como algo paralelo às outras mídias (televisão, internet, etc); leia "A linguagem secreta do cinema de Jean Claude Carrière", entre outras referências bem bacanas que ajudam a descontruir essa visão preconceituosa de muitos cinéfilos, defensores de somente um tipo de cinema, tido como o suposto 'cinema-arte', ou o verdadeiro cinema. (continua)

ally_c disse...

Outra coisa. O cinema surgiu e se consolidou como indústria e tudo que se distancia dessa concepção ainda assim está relacionada a ela. Não só falo isso como defendo na minha dissertação de mestrado, ainda em construção. Ele só ganhou a concepção de arte mais tarde. E muita coisa no âmbito da arte que era considerado lixo, hoje ganhou o status de arte e foi reconhecido como valioso. Cinema marginal, cinema trash, cinema do Charles Chaplin, a violência estética do Tarantino e outras coisas mais. A saga Crepúsculo é sim um blockbuster, voltado para um público leigo e condicionado, porém qualquer um pode gostar por uma série de outros motivos e nem por isso ser leigo ou condicionado. Você não gosta, tudo bem, mas desconfie até do seu gosto. Em relação a tudo! Porque você gosta de certas coisas e não gosta de outras?! Você acha mesmo que tem liberdade para escolher o que gosta?! Há vários filmes que você comenta no seu blog que são tão superficiais e tolos quanto Crepúsculo, a diferença é que você gosta deles e pra você eles são bons, mas pra muitos outros é um lixo. E aí?! Quem tem razão?! Ninguém! Preocupe-se em entender porque as meninas gostam e use isso no seu texto. Será que é só porque há homens seminus e cenas de romance? É só por isso? Ou vai mais além?! Qual garota nunca quis pertencer ao grupo? Ser notada? Essas vão se identificar. As que não se importam com isso, talvez detestem, mas até aí podemos pensar nos motivos. Elas detestam porque não querem ter a sensação de pertencimento a grupo nenhum e afirmar sua singularidade?! Porque será que vocês não gostam? Porque o filme é tolo ou porque muitos sentimentos nem afloraram em vocês ainda?! Crepúsculo é tão 'tolo' quanto interessante, como qualquer outro filme, isso vai depender da ligação afetiva do espectador com o filme. Você vê o que 'quiser' ver!! (continua)

ally_c disse...

E mais, se você percorrer a história do vampiro na literatura e cinema, vai entender que os vampiros criados na Saga Crepúsculo, enquanto produto de consumo, refletem os valores presentes na sociedade hoje, como consumismo, status social, riqueza, aparência, etc. Isso se aplica ao estudo dos brinquedos, onde você pode analisar a partir da Barbie, a criança que a sociedade está preparando. Ou seja, esses produtos de consumo hoje vão ajudar a construir a nossa história atual no futuro, como fazemos com os artefatos do nosso passado para entender nosso presente. Eles fazem parte da sociedade e se você observasse com mais atenção, poderia tentar extrair desses filmes características da nossa sociedade atual, e nisso, o filme não tem nada de tolo. Obviamente não é intenção dele fazer isso, mas você como alguém que analisa e critica filmes pode enxergar e colocar nos seus textos. Se esforce em sair da superfície, você tem perfil, é observador, esforçado e conseguirá. E jamais se apegue ao fato de achar que sabe muito só porque vê muitos filmes. Pense em qualidade e não quantidade! E desaprenda seus preconceitos, e poderá ver bem mais além!